Historia da igreja dos Estados Unido sec 17-19 n.2
Historia da igreja dos Estados Unido sec 17-19 n.2
O “século protestante” (1800-1900)
Os evangélicos deram uma grande contribuição na Guerra da Independência, tanto no aspecto prático quanto ideológico. No entanto, após a Revolução as igrejas estavam claramente desorganizadas e o papel do cristianismo na nova cultura nacional não estava de modo algum garantido. A filiação formal às igrejas estava em declínio, tendo chegado ao seu ponto mais baixo na década de 1790 (de 5 a 10% da população adulta). Reagindo contra essa situação, as igrejas superaram a confusão reinante e empreenderam vigorosas campanhas para evangelizar o povo e cristianizar a cultura. Juntos, os representantes das igrejas coloniais e os dinâmicos líderes das novas denominações formaram uma frente protestante que dominou a percepção pública da religião nos Estados Unidos. O “império evangélico” esteve na vanguarda até que o pluralismo cristão e a diversidade cultural introduziram uma nova realidade.
3.1 A “América evangélica” (1800-1865)
3.1.1 O Segundo Despertamento
O Segundo Grande Despertamento foi o reavivamento mais influente da história do cristianismo nos Estados Unidos. Desde 1795 até por volta de 1810 surgiu um renovado interesse pelo cristianismo em todo o país. Por sua vez, essa renovação serviu de modelo e ímpeto para ondas semelhantes de reavivamento que continuaram a ocorrer em toda a nação até depois da Guerra Civil.
Na região da fronteira, o novo interesse religioso resultou do dedicado trabalho missionário de presbiterianos, batistas e metodistas. Um evento importante foi o “camp meeting” realizado em Cane Ridge, no Kentucky, em 1801. Os “camp meetings” eram vibrantes reuniões evangelísticas ao ar livre com a duração de vários dias, nos quais os participantes ficavam alojados em tendas e ouviam diferentes pregadores. Os resultados de Cane Ridge foram notáveis: ao lado de muitas manifestações emocionais houve um rápido crescimento das igrejas, não somente presbiterianas, mas principalmente metodistas e batistas. Os pregadores itinerantes metodistas (“circuit riders”) e os pregadores-colonos batistas espalharam-se pelo sul e pelo oeste em números impressionantes. Na década de 1830 esses dois grupos haveriam de ultrapassar os congregacionais e os presbiterianos, tornando-se as maiores denominações não somente no sul, mas em todo o território nacional.
Mark Noll fornece dados estatísticos impressionantes sobre as alterações verificadas nos percentuais de filiação religiosa nos Estados Unidos entre a independência e meados do século 19:
SECULO -1776-1850
Congregacionais
20,4%
Metodistas
34,2%
Presbiterianos
19,0%
Batistas
20,5%
Batistas
16,9%
Católicos romanos
13,9%
Episcopais
15,7%
Presbiterianos
11,6%
Metodistas
2,5%
Congregacionais
4,0%
Católicos romanos
1,8%
Episcopais
3,5%
No leste, o interesse pelo avivamento manifestou-se entre vários ministros congregacionais de Connecticut. A manifestação mais visível ocorreu como resultado do trabalho de Timothy Dwight (1752-1817), o neto de Jonathan Edwards que se tornou presidente do Yale College em 1795. Em 1802 houve um grande avivamento no campus que levou à conversão de um terço dos 225 estudantes, muitos dos quais tornaram-se agentes do avivamento na Nova Inglaterra, no Estado de Nova York e no oeste. Logo, quase não havia um lugar em que os cristãos não estivessem orando pelo avivamento ou agradecendo a Deus por terem-no recebido.
Esses reavivamentos tiveram em comum com os despertamentos do período colonial um forte interesse pela salvação pessoal e pela renovação do cristianismo dos dois lados do Atlântico. Mas houve também importantes diferenças. Enquanto o primeiro despertamento foi liderado por congregacionais (Jonathan Edwards), anglicanos (George Whitefield) e presbiterianos (Gilbert Tennent), o segundo foi rapidamente dominado pelos metodistas, batistas e discípulos de Cristo (Barton Stone e Alexander Campbell). O Segundo Despertamento também produziu efeitos mais duradouros que o primeiro. A grande quantidade de sociedades voluntárias surgidas nos Estados Unidos nas três primeiras décadas do século 19 foi um resultado direto do daquele reavivamento.
Um dos alunos de Timothy Dwight, Lyman Beecher (1775-1863), dedicou-se a arregimentar as forças do reavivamento em organizações permanentes que visavam evangelizar e reformar os Estados Unidos. Graças aos seus esforços, e aos de pessoas com a mesma visão, foram fundadas entidades como a Junta Americana para Missões Estrangeiras (1810), a Sociedade Bíblica Americana (1816), a Sociedade de Colonização para escravos libertos (1817), a União Americana das Escolas Dominicais (1824), a Sociedade Americana de Tratados (1825), a Sociedade Americana de Educação (1826), a Sociedade Americana para a Promoção da Temperança (1826), a Sociedade Americana de Missões Nacionais (1826) e muitas outras organizações. Essas agências deram ao Segundo Despertamento uma duradoura influência institucional que o primeiro não produziu.
A teologia do Segundo Grande Despertamento também foi diferente da tradição reavivalista anterior. Com sua ênfase na soberania de Deus sobre todas as coisas, Edwards e Whitefield haviam acentuado a incapacidade de os pecadores salvarem a si mesmos. Em contraste, a teologia dos principais avivalistas do século 19, tanto no norte quanto no sul, sugeriu que Deus havia concedido a todas as pessoas a capacidade de irem a Cristo. Essa mudança de perspectiva estava relacionada não somente com os eventos políticos e intelectuais mais amplos, mas com o grande desejo de uma teologia de ação que pudesse incentivar e justificar a expansão dos reavivamentos.
3.1.2. Dois grandes líderes
Dois líderes personificaram de maneira especial as principais ênfases desse avivamento. O primeiro foi o inglês Francis Asbury (1745-1816), que viajou extensamente através dos Estados Unidos promovendo a causa metodista e liderou a organização oficial dessa denominação em 1784. Pelo fato de ter percorrido mais de 450 mil km, em grande parte a cavalo, ele conheceu o interior americano melhor que qualquer um dos seus contemporâneos e foi também o homem mais conhecido do seu tempo. Quando Asbury chegou aos Estados Unidos em 1771, somente quatro missionários metodistas davam assistência a cerca de 300 pessoas. Quando ele faleceu, havia 2 mil pastores e mais de 200 mil metodistas no país.
Outro líder imensamente influente foi Charles Grandison Finney (1792-1875), o mais famoso avivalista americano na parte intermediária do século 19. Convertido de modo dramático em 1821, ele imediatamente começou a pregar de maneira vigorosa. Um grande reavivamento em Rochester no inverno de 1830-31 deu-lhe notoriedade nacional. Nessa época, ele rompeu definitivamente com o seu presbiterianismo de origem, que ele julgava excessivamente burocrático e possuidor de uma teologia que não valorizava a capacidade humana natural. Finney estabeleceu o seu quartel general no Oberlin College, em Ohio, um centro de evangelismo e reforma social. Ele escreveu livros que também divulgaram amplamente as suas idéias, como Lectures on Revivals (1835) e Systematic Theology (1846-47). Seu impacto foi especialmente forte no sentido de moldar as práticas do avivamento. Entre as suas “novas medidas” estava o “banco ansioso” (anxious bench), uma área especial, geralmente na frente do auditório, à qual as pessoas eram chamadas para orar e ser exortadas quanto à condição das suas almas. Outro recurso era o “protracted meeting”, as reuniões noturnas que se prolongavam por várias semanas. Quando os críticos diziam que as novas medidas davam excessiva ênfase à ação humana na conversão e quase nenhuma a Deus, ele se defendia dizendo que elas funcionavam.
Em sua teologia, Finney foi ainda mais arminiano que John Wesley. Este sustentava que a vontade humana é incapaz de escolher a Deus sem a sua graça preparatória. Finney rejeitou esse requisito: ele cria que era possível uma condição permanente de vida espiritual superior para todo aquele que a buscasse de todo o coração. Seguindo os teólogos da Nova Inglaterra, ele aceitava uma noção governamental da expiação segundo a qual a morte de Cristo foi uma demonstração pública da disposição de Deus em perdoar os pecados antes que o próprio pagamento pelo pecado. Finney envolveu-se com um grande número de iniciativas religiosas e sociais, mas seu maior impacto, assim como o de Asbury, foi no sentido de modificar o caráter do evangelicalismo norte-americano tornando-o menos calvinista, mais arminiano e assim melhor identificado com os valores e as aspirações da nova república.
3.1.3. Os batistas
O Segundo Grande Despertamento estimulou um enorme esforço missionário, voltado tanto para o próprio país como para o exterior. Um dos grupos que mais se destacaram nesse aspecto foram os batistas. Especialmente nos estados do sul e nos novos estados do oeste americano eles se tornaram líderes na evangelização da fronteira. Em 1812 havia perto de 200 mil batistas nos Estados Unidos; em 1850 já eram mais de um milhão.
No período anterior à Guerra Civil, a teologia batista foi predominantemente calvinista. Uma importante confissão redigida para uma convenção de New Hampshire em 1833 tornou-se uma declaração de fé batista amplamente utilizada. (Ver Reily, História Documental, 129-132). À exceção dos princípios de organização eclesiástica, as partes doutrinárias dessa confissão aproximavam-se do tipo de teologia promovido por congregacionais e presbiterianos conservadores. Ao mesmo tempo, as práticas batistas davam grande ênfase à conversão pessoal e os batistas também partilhavam da confiança americana nas capacidades de um povo livre. Isso atenuava junto a muitos batistas as doutrinas calvinistas da eleição incondicional e da expiação limitada. Mas durante todo o século 19, os batistas continuaram parecidos com os calvinistas mais antigos em sua teologia formal.
Apesar de sua defesa intransigente da autonomia das igrejas locais, os batistas logo começaram a trabalhar em conjunto, especialmente na área de missões. Em 1814 foi fundada a Convenção Missionária Geral, voltada para missões estrangeiras, e em 1832 a Sociedade Batista de Missões Nacionais. Por causa das tensões entre o norte e o sul em torno da escravidão, foi formada em 1845 a Convenção Batista do Sul, quando os batistas pela primeira vez assumiram uma estrutura denominacional completa (a Convenção Batista do Norte só foi criada em 1905). Muitos batistas resistiram contra essa nova denominação predominantemente calvinista. Alguns eram arminianos, como os “batistas do livre arbítrio” ou “batistas gerais”. Outros, embora calvinistas, eram defensores intransigentes da autonomia da igreja local e não viam com bons olhos as atividades missionárias e educacionais conjuntas que retiravam recursos e pessoal do controle das congregações locais. Mais tarde, esses dissidentes influenciaram o surgimento de uma ênfase conhecida como “landmarkismo” na Convenção Batista do Sul, nome extraído do influente livro An Old Landmark Re-Set (1854), de James R. Graves.
3.1.4. Visão missionária
As missões protestantes dos países de língua inglesa tiveram início em 1793, quando William Carey partiu da Inglaterra para a Índia. Pouco depois, os americanos também deram início ao seu trabalho missionário no exterior. Esse movimento resultou de um reavivamento ocorrido no Williams College, em Massachusetts, que rapidamente alcançou os estudantes do recém-criado Seminário Teológico de Andover, no mesmo estado. Andover, a primeira escola de teologia dos Estados Unidos, foi fundado em 1807 por um grupo de congregacionais trinitários da Nova Inglaterra em protesto contra o desvio do Harvard College para o unitarismo.
Sob a liderança de Samuel J. Mills, Jr. (1783-1818), foi fundada em 1810 a Junta Americana de Comissionados para Missões Estrangeiras, que dois anos depois enviou para a Índia e o Extremo Oriente os primeiros missionários americanos, o mais famoso dos quais foi Adoniram Judson (1788-1850). Judson tornou-se batista ainda durante a viagem para a Índia e em 1814 ajudou a criar a Convenção Missionária Geral ou Convenção Batista Trienal. Ele trabalhou por quase quarenta anos na Birmânia. Devido a problemas de saúde, Samuel Mills não pode seguir para o exterior, mas viajou amplamente pelo oeste americano e contribuiu para a criação da Sociedade Americana de Missões Nacionais (1826).
3.1.5. Os presbiterianos
Em 1788, o Sínodo de Nova York e Filadélfia dividiu-se em quatro (Nova York e Nova Jersey, Filadélfia, Virgínia e Carolinas). No dia 21 de maio de 1789, reuniu-se pela primeira vez a “Assembléia Geral da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos da América”. Naquela época, a Igreja Presbiteriana era a denominação mais influente do país. Em 1800, contava com 180 pastores, 450 igrejas e cerca de 20 mil membros.
Em 1801, presbiterianos e congregacionais iniciaram um trabalho cooperativo conhecido como “Plano de União”. O objetivo era evangelizar com mais eficiência a população que estava indo para o oeste, a chamada “fronteira”. O resultado foi um avanço fenomenal. Em 1837, a Igreja Presbiteriana já contava com 2140 pastores, quase 3000 igrejas e 220 mil membros. O Seminário de Princeton foi fundado em 1812 (entre seus grandes professores estiveram Archibald Alexander, Charles Hodge, A.A. Hodge e Benjamin B. Warfield).
Devido a uma controvérsia sobre os requisitos para a ordenação de ministros, surgiu em 1810 a Igreja Presbiteriana de Cumberland, no Tennessee. Uma divisão mais séria ocorreu entre os grupos conhecidos como Velha Escola e Nova Escola, aquele sendo mais apegado aos padrões de Westminster do que este. Em 1837, a Velha Escola obteve a maioria na Assembléia Geral, cancelou o Plano de União de 1801 e excluiu quatro sínodos inteiros, dividindo ao meio a denominação. Foi criada a Junta de Missões Estrangeiras. Finalmente, em 1857 e 1861 ocorreram novas divisões, desta vez ocasionadas pelo problema da escravidão. As igrejas Nova Escola e Velha Escola do sul, favoráveis à escravidão, separaram-se das do norte. Eventualmente, foram criadas duas grandes denominações presbiterianas, a Igreja do Sul (PCUS, 1867) e a Igreja do Norte (PCUSA, 1870).
3.1.6 Grupos periféricos
Ao lado das denominações evangélicas principais, vários grupos periféricos surgiram nos primeiros anos da república americana. Um desses grupos foi iniciado por William Miller (1782-1849), um colono do Estado de Nova York que anunciou o retorno de Cristo para 1843-44. Quando isso não ocorreu, alguns abandonaram o movimento, mas outros perseveraram. Ainda outros continuaram a sustentar convicções adventistas em diversos movimentos menores. Um destes, sob a liderança de Ellen White (1827-1915), concluiu que Cristo havia de fato voltado como Miller tinha predito, mas que o retorno foi espiritual, para a presença do Pai. Esse foi o início dos modernos adventistas do sétimo dia.
Se os milleritas estavam na linha divisória entre os evangélicos e os sectários, os mórmons liderados por Joseph Smith (1805-1844) ficaram claramente do lado de fora. Nascido em uma família profundamente religiosa originária da Nova Inglaterra e residente no Estado de Nova York, Miller começou a ter visões de seres celestiais no início da década de 1820. Alguns anos depois, declarou ter recebido do anjo Moroni o Livro de Mórmon, que detalhava o relacionamento especial de Deus com os habitantes pré-históricos da América e as tribos perdidas de Israel. Um ano após publicar a tradução do livro (1830), Smith e seus seguidores mudaram-se para Ohio. Depois que Smith foi morto por uma turba em Illinois, Brigham Young tornou-se seu sucessor e liderou os mórmons em sua grande migração para a região do Lago Salgado, em Utah (1846-48).
Outro acontecimento notável do início do período republicano foi a criação de denominações afro-americanas. Tal foi o caso da Igreja Metodista Episcopal Africana, fundada por Richard Allen (1760-1831) em 1814, em Filadélfia. Na década seguinte, as igrejas e denominações negras estavam atuando em diversas áreas, como missões e reforma social. Em 1845, os negros batistas do norte fundaram a Sociedade Missionária Batista Africana. No sul escravagista, tais oportunidades foram muito mais limitadas.
Outro grupo que adquiriu grande visibilidade nesse período foi a Igreja Católica. Em 1789, quando houve a eleição do primeiro bispo católico dos Estados Unidos, havia cerca de 35 mil católicos no país, sessenta por cento deles em Maryland, e pouco mais de trinta sacerdotes. Em 1830, o número total de católicos havia ultrapassado a casa dos 300 mil. Nos trinta anos seguintes, enquanto a população nacional aumentou duas vezes e meia (de 13 para 31,5 milhões), a população católica cresceu quase dez vezes, totalizando mais de 3 milhões de pessoas. A causa mais importante desse aumento foi a imigração, principalmente da Irlanda e da Alemanha.
No mesmo período, chegaram da Europa muitos imigrantes protestantes, particularmente luteranos e pietistas alemães, reformados holandeses e luteranos escandinavos. Entre 1800 e 1920, os Estados Unidos receberam cerca de 40 milhões de imigrantes, entre os quais estava uma significativa minoria protestante. Muitos desses imigrantes formaram igrejas que inicialmente eram ligadas a organizações européias, mas depois se tornaram denominações autônomas.
3.1.7 Teologia protestante
Os teólogos estavam entre os intelectuais mais respeitados dos Estados Unidos antes da Guerra Civil. A obra de quase todos eles exibia algumas convicções comuns como a inspiração divina das Escrituras, um interesse pelos problemas teológicos definidos pela tradição calvinista dos puritanos e de Edwards e o uso da filosofia escocesa do senso comum como método intelectual. Essa filosofia afirmava que os sentidos físicos comunicam informações fidedignas sobre o mundo exterior e dava ênfase ao sentido moral (consciência) acerca do mundo espiritual. Esses teólogos também se interessavam pela cultura americana, afirmando os princípios de liberdade política, republicanismo e oportunidades democráticas que haviam sido abraçados pela Revolução.
O último estágio da evolução do pensamento que havia começado com o Grande Despertamento e com Jonathan Edwards foi denominado de Teologia de New Haven (ou da Nova Inglaterra). Timothy Dwight, neto de Edwards e presidente do Yale College na virada do século (1759-1817), foi um personagem chave no sentido de modificar algumas doutrinas do calvinismo colonial para utilização no século 19. Todavia, quem desenvolveu de modo mais consistente a Teologia de New Haven foi seu discípulo mais destacado, Nathaniel William Taylor (1786-1858). Em 1822, Taylor tornou-se o primeiro professor da nova Escola de Teologia de Yale, onde se considerava um herdeiro de Edwards e um campeão na luta contra o unitarismo. Porém, Taylor era acentuadamente diferente de Edwards em suas convicções acerca da natureza humana. Ele certa vez afirmou que as pessoas têm “capacidade para o contrário” quando confrontadas com escolhas morais. Com isso ele quis dizer que a pecaminosidade resulta de atos pecaminosos e não de uma natureza pecaminosa herdada de Adão. De fato, todas as pessoas pecam, mas elas não estão condicionadas a fazê-lo em virtude da natureza humana em si. A Teologia de New Haven foi um poderoso estímulo para o reavivamento e as reformas, uma vez que fornecia uma justificativa para as pessoas confiarem em Deus ao mesmo tempo em que exerciam ao máximo as suas próprias capacidades. Essa teologia emergiu da tradição calvinista, mas a sua ênfase na capacidade humana levou-a em direção ao metodismo que exercia grande influência sobre a religiosidade americana.
O unitarismo combatido por Taylor e seus companheiros teve o seu melhor representante na pessoa de William Ellery Channing (1780-1842). Channing havia crescido sob a influência das pregações de Samuel Hopkins, o discípulo mais fiel de Edwards, e teve uma experiência de conversão enquanto estudava em Harvard. Em 1803, tornou-se pastor da Igreja Congregacional de Federal Street, em Boston, onde permaneceu o restante da sua vida. Sua presença, bem como o liberalismo do Harvard College, fizeram de Boston a cidadela do unitarismo. Num famoso sermão pregado em 1819, Channing investiu contra as doutrinas tradicionais da Trindade, da divindade de Cristo, da depravação total e da expiação vicária. Em outras ocasiões, ele afirmou a perfectibilidade dos seres humanos, a paternidade de Deus, a perfeição moral de Cristo e a realidade da ressurreição. Ele cria que a Bíblia registrava a inspiração, mas não era inspirada em si mesma.
Charles Finney (1792-1875), quando ainda presbiteriano, leu as obras de Nathaniel W. Taylor e concluiu que o mesmo estava correto: os seres humanos têm dentro de si a capacidade de escolher a Cristo e viver vidas santas. Após deixar o presbiterianismo, ele leu a obra Plain Account of Christian Perfection, de John Wesley, e teve confirmada a sua crença na possibilidade da “inteira santificação”. Quando Finney tornou-se professor de teologia no Oberlin College (1835), sua teologia adquiriu forma definitiva com os seguintes componentes: compromisso com as “novas medidas” no avivamentismo, compromisso com a reforma moral e crença em um segundo estágio, mais maduro, na vida cristã. Esta última convicção foi desenvolvida por diferentes professores de Oberlin, que usavam expressões como “santidade”, “perfeição cristã” e “batismo do Espírito Santo”, que mais tarde exerceriam grande influência no desenvolvimento de teologias evangélicas, “holiness” e pentecostais. A influência de Finney foi ampliada consideravelmente por seus colaboradores, entre os quais o primeiro presidente de Oberlin, Asa Mahan (1799-1889), um enérgico proponente da Teologia de Oberlin.
Nem todos os calvinistas do século 19 estavam interessados em rever a sua herança em resposta às circunstâncias contemporâneas. Entre aqueles que insistiram em preservar o calvinismo tradicional estavam os teólogos do Seminário de Princeton. Esse seminário, fundado em 1812, por mais de um século foi o centro do calvinismo conservador americano. As convicções do primeiro professor do seminário, Archibald Alexander (1772-1851), determinaram as ênfases dessa teologia. Alexander era um homem de profunda piedade pessoal cuja teologia formal associou algumas ênfases do calvinismo europeu (Calvino, a Confissão de Westminster e Francisco Turretino) com uma defesa anticatólica das Escrituras através de recursos intelectuais definidos pela filosofia escocesa do senso comum.
Um discípulo de Alexander, Charles Hodge (1797-1878) transformou essa perspectiva teológica em um poderoso sistema de pensamento ao longo dos seus cinqüenta e seis anos como professor em Princenton. Hodge utilizou as mesmas fontes que Alexander havia usado para defender a glória de Deus (em vez da felicidade humana) como o propósito da vida, afirmar o poder do Espírito Santo na salvação (contra idéias de autodeterminação humana) e defender as Escrituras como a fonte apropriada da teologia (em contraste com a experiência religiosa ou os ditames da razão). Hodge certa vez afirmou orgulhosamente que nunca havia surgido uma nova idéia em Princeton, com o que ele quis dizer que a instituição queria transmitir a fé reformada como esta havia sido definida nos séculos 16 e 17. Todavia, Hodge e os princetonianos fizeram algumas adaptações à sua época, especialmente ao utilizarem os métodos científicos correntes como modelo para o seu trabalho. A fórmula de Hodge, “a Bíblia é para o teólogo o que a natureza é para o cientista”, foi usada para preservar o calvinismo tradicional, mas tomou como certos alguns conceitos e procedimentos que eram uma parte importante da vida intelectual americana no século 19.
No sul, com sua ordem social mais conservadora, as formas mais antigas da teologia tradicional sobreviveram de maneira ainda mais vigorosa do que no norte. James H. Thornwell (1812-1862) e Robert Dabney (1820-1898) foram defensores eficazes de um calvinismo não diluído pelas idéias modernas de autodeterminação pessoal. Thornwell, que era ligado ao Seminário Teológico de Columbia, tinha um calvinismo semelhante ao de Hodge, com a diferença de que dava maior ênfase à integridade da igreja e dos seus níveis superiores de jurisdição como um princípio espiritual. Dabney articulou uma forma moderada do calvinismo de Westminster, dando atenção especial às maneiras pelas quais a providência divina atua lado a lado com o curso regular da natureza, antes que em oposição ao mesmo. O calvinismo conservador dos dois teólogos também foi influenciado decisivamente pelo seu contexto sulista, pois eles acharam natural defender tanto a teologia tradicional quanto a ordem social tradicional da escravidão.
Outros teólogos destacados do sul foram os batistas J. M. Pendleton (1811-1891) e J. R. Graves (1820-1893), os articuladores do landmarkismo (termo derivado de Provérbios 22.28), uma concepção segundo a qual a organização eclesiástica e as práticas batistas eram as únicas formas cristãs fiéis ao Novo Testamento, sendo que igrejas que manifestavam esse rigoroso compromisso batista retrocediam até a época do Novo Testamento. Também notabilizaram-se Barton W. Stone (1772-1844) e Alexander Campbell (1788-1866), líderes dos chamados “cristãos” ou “discípulos de Cristo”, um movimento restauracionista que buscava recuperar a pureza original de um cristianismo voltado apenas para a Bíblia.
Outro pensador muito influente foi Horace Bushnell (1802-1876), pastor da Igreja Congregacional de Hartford, Connecticut. Com sua ênfase na experiência, ele antecipou as teologias protestantes, tanto liberais quanto conservadoras, que adotariam a experiência como seu princípio fundamental. Bushnell foi influenciado por Friedrich Schleiermacher e mais ainda por Samuel Taylor Coleridge, de quem aprendeu uma concepção mais romântica de Deus, da humanidade e do mundo. Em sua obra mais famosa, o tratado intitulado Christian Nurture (1847), ele argumentou contra os aspectos grosseiros do avivamentismo popular e defendeu um cristianismo centralizado no ambiente doméstico.
Uma tradição teológica que partilhava da mesma inquietação quanto ao evangelicalismo reavivamentista surgiu no seminário reformado alemão de Mercersburg, na Pensilvânia. Essa teologia foi articulada principalmente por John Williamson Nevin (1803-1886) e Philip Schaff (1819-1893). Nevin estudou com Charles Hodge em Princeton, mas concluiu que o calvinismo do seu mestre era excessivamente “puritano” e que o evangelicalismo americano em geral era muito influenciado por um reavivalismo mecânico. Após tornar-se professor do pequeno seminário de Mercersburg em 1840, ele sentiu o impacto do Catecismo de Heidelberg e de teólogos alemães interessados na renovação das tradições da Reforma. Respondendo a essas influências, Nevin criticou o reavivamentismo americano por dar excessiva ênfase ao indivíduo. Ele também atacou a ortodoxia calvinista americana por dar pouca ênfase à obra de Cristo e à Ceia do Senhor. Schaff, que passou a trabalhar com Nevin em 1844, trouxe consigo uma apreciação pela nova filosofia idealista alemã e um profundo compromisso com a renovação da igreja nos moldes pietistas. A maior influência desses teólogos somente se faria sentir no século XX.
3.1.8 As igrejas e a Guerra Civil
A Guerra Civil (1861-65) entre o norte e o sul dos Estados Unidos foi o mais sangrento conflito armado de que aquele país já participou, com mais de 620 mil soldados mortos. O sul ficou devastado, somente conseguindo recuperar-se economicamente em meados do século XX. Houve duas razões principais para a guerra: a definição dos Estados Unidos como nação (um país unido ou um grupo de estados que podiam separar-se à hora que quisessem?) e o problema da escravidão. Um momento decisivo foi a emancipação dos escravos, decretada pelo presidente Abraham Lincoln em 1863.
O cristianismo teve presença marcante na crise que resultou na Guerra Civil e na própria guerra. Como na Revolução Americana, a fé cristã em si não foi uma causa do conflito, mas ela proporcionou uma rede de influências que intensificaram as divergências políticas, sociais e culturais que resultaram no conflito. Tão intensos quanto o compromisso religioso com a guerra foram os amplos efeitos religiosos que ela precipitou. No aspecto prático, as igrejas foram usadas como postos de recrutamento e as tropas eram enviadas para a batalha mediante a realização de um culto. As mulheres foram mobilizadas para fazer uniformes para os exércitos. Os ministros ficaram em situação difícil, presos entre a sua consciência e a lealdade regional. Leonidas Polk, o bispo episcopal da Luisiana, tornou-se um general no exército sulista. Muitos hinos foram escritos, dos quais o mais famoso foi “The Battle Hymn of the Republic” (Vencendo Vem Jesus).
3.2 Os últimos anos da “América Protestante” (1865-1918)
Após a Guerra Civil, ocorreram enormes mudanças na sociedade americana que afetaram profundamente o cenário religioso. O protestantismo clássico – os grupos que se consideravam os protetores da herança cristã americana e os construtores de uma sociedade nitidamente protestante – viu a sua influência declinar com a passagem dos anos. Na segunda metade do século 19 houve um grande crescimento do número de cristãos não-protestantes (católicos, ortodoxos) ou que não eram de língua inglesa (alemães, holandeses, escandinavos), bem como de não-cristãos (judeus, muçulmanos, orientais). Além disso, surgiram crescentes tensões dentro da própria comunidade protestante majoritária. Todavia, por algum tempo os protestantes brancos anglo-saxônicos continuaram a exercer forte influência e a dedicar-se com entusiasmo a atividades missionárias (nacionais e estrangeiras) e sociais.
3.2.1 Missões
O ímpeto de difundir o evangelho tornou-se ainda mais forte após a Guerra Civil. Um reavivamento ocorrido em 1857-58, às vezes denominado o “despertamento dos homens de negócios” por causa da participação de destacados empresários urbanos na promoção do mesmo, havia estabelecido um modelo para o evangelismo urbano posterior e também elevado as expectativas quanto às atividades missionárias no exterior.
O evangelista mais conhecido da segunda metade do século 19 foi Dwight Lyman Moody (1837-1899). Moody nasceu no interior de Massachusetts e passou parte da adolescência em Boston, vindo ali a converter-se. Pouco antes da Guerra Civil, mudou-se para Chicago, onde se envolveu com o trabalho da Associação Cristã de Moços e passou a dar assistência às crianças pobres da cidade. Em 1873, convidou o cantor evangélico Ira Sankey (1840-1908) para acompanhá-lo numa campanha evangelística na Inglaterra. Os resultados foram muito além das suas mais ousadas expectativas. Regressaram dois anos mais tarde aos Estados Unidos cercados de enorme celebridade e deram início a uma série de memoráveis campanhas que marcaram profundamente as igrejas e a sociedade. Essa revitalização chegou num momento em que o país sofria com o fracasso da reconstrução do sul, o temor da influência católica e os problemas da expansão urbana e industrial.
Moody inaugurou um novo estilo de pregação e evangelismo, mais comedido e melhor adaptado à época do pós-guerra, que seria seguido por muitos de seus sucessores até os nossos dias (Billy Graham). Ele ampliou a sua influência através de importantes instituições que fundou, como um centro de treinamento para obreiros leigos em Chicago (o futuro Instituto Bíblico Moody) e as conferências missionárias de verão realizadas perto da sua residência em Northfield, Massachusetts. Dessas conferências resultou a criação do Movimento Voluntário Estudantil (1876), que inspirou milhares de jovens a dedicarem suas vidas ao esforço missionário mundial.
Os principais promotores de missões estrangeiras nessa época foram homens como o presbiteriano Arthur Tappan Pierson (1837-1911), um dos fundadores da Missão do Interior da África; o batista Adoniram Judson Gordon (1836-1895), fundador do Instituto de Treinamento Missionário de Boston; A. B. Simpson (1843-1919), o fundador da igreja Aliança Cristã e Missionária; John R. Mott (1865-1955), autor da famosa senha “A evangelização do mundo nesta geração”; e principalmente Robert Eliott Speer (1867-1947), que, após participar do Movimento Voluntário Estudantil, foi por mais de quarenta anos (1891-1937) o secretário da Junta de Missões Estrangeiras da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos.
Nas últimas décadas do século 19 houve um crescimento impressionante das missões protestantes norte-americanas através do mundo, coincidindo com a própria expansão econômica, política e militar dos Estados Unidos. Isso criou uma mistura de motivações missionárias e nacionalistas que por vezes gerou sérios problemas. Na mesma época, ganhou ímpeto a tendência de aproximação dos missionários e agências de diferentes denominações, que resultou na realização de grandes conferências missionárias dos dois lados do Atlântico e contribuiu para o surgimento do movimento ecumênico do século XX.
3.2.2. Envolvimento social
Além do interesse por missões, as igrejas americanas também se envolveram em atividades políticas e de reforma social, como a campanha contra a venda e o consumo de bebidas alcoólicas (o movimento da temperança). Os protestantes preocuparam-se especialmente com os problemas gerados pela expansão econômica e o resultante crescimento das cidades. Os centros urbanos tornaram-se lugares em que os muitos imigrantes e outras minorias viviam na pobreza, sem usufruir a prosperidade que beneficiava a tantos ao seu redor. Um das iniciativas mais bem-sucedidas no sentido de enfrentar esses problemas foi o Exército de Salvação. Essa organização religiosa e caritativa foi criada na Inglaterra na década de 1860 por William Booth, sendo levada para os Estados Unidos em 1880. No início do século XX, o Exército da Salvação já possuía mais de novecentos locais de atendimento no país, proporcionando assistência religiosa, alimento, abrigo, assistência médica, educação primária, treinamento profissional, assistência jurídica e outros serviços.
Outra iniciativa de grande impacto foi o movimento do Evangelho Social, que esteve em evidência desde aproximadamente 1880 até o início da Grande Depressão, em 1929. Um dos primeiros articuladores do movimento foi Washington Gladden (1836-1918), um ministro congregacional que atuou em Massachusetts e Ohio e foi ardoroso defensor dos direitos dos trabalhadores. Charles Sheldon, um pastor do Kansas também contribuiu para popularizar o Evangelho Social através do seu famoso livro Em Seus Passos (1897). Porém, o mais importante expoente desse movimento foi Walter Rauschenbusch (1861-1918), um pastor batista de origem alemã que trabalhou por dez anos no bairro novaiorquino conhecido como Hell’s Kitchen (“cozinha do inferno”) antes de tornar-se professor de história da igreja no Seminário de Rochester. Seu contato direto com a exploração dos operários e a indiferença das autoridades fizeram dele um crítico da ordem estabelecida. Todavia, seu principal interesse foi buscar nas Escrituras uma mensagem para os problemas da sociedade industrial. Esse esforço resultou em alguns livros marcantes publicados no início do século XX: O Cristianismo e a Crise Social (1907), Orações do Despertamento Social (1910), Cristianizando a Ordem Social (1912) e Uma Teologia do Evangelho Social (1917).
3.2.3 Desafios intelectuais
O novo ambiente urbano posterior à Guerra Civil ofereceu pressões comerciais mais intensas, maior acesso à educação superior e crescente contato com pessoas de diferentes grupos étnicos e religiosos, fatores esses que contribuíram até certo ponto para solapar o caráter evangélico da fé nacional. Além dessas mudanças sociais, ocorreram alguns deslocamentos intelectuais que apontavam para a fragmentação do cristianismo protestante que por mais de um século havia dominado a religião pública dos Estados Unidos.
O período pós-guerra testemunhou o surgimento da moderna universidade americana, começando com Harvard, em 1869, e Johns Hopkins, em 1876, seguidas de Stanford, Universidade de Chicago, Yale, Princeton, Columbia, Michigan e Winsconsin. Os recursos para essas instituições vieram da nova classe de riquíssimos empresários como Ezra Cornell, Johns Hopkins, Cornelius Vanderbilt, Leland Stanford, James Duke e John D. Rockefeller. O objetivo das mesmas não era mais a formação do caráter, como havia sido tradicionalmente, mas a instrução especializada, em nível de pós-graduação, segundo o modelo alemão de vida acadêmica. Essa tendência foi acompanhada do enfraquecimento da influência cristã nessas instituições e de uma quase ilimitada confiança na ciência.
Certas proposições acerca da Bíblia também causaram um grande impacto. Boa parte dos estudos avançados vindos da Europa no final do século 19 parecia minar a antiga confiança que a maior parte dos americanos havia depositado na veracidade das Escrituras. As novas concepções da crítica histórica transformaram a Bíblia de uma fonte inquestionável de autoridade religiosa em um problema que exigia crescente atenção e gerava crescente controvérsia.
Ao contrário do que aconteceria a partir de 1920, as primeiras adaptações dos protestantes às novas condições sociais e às idéias críticas modernas foram relativamente isentas de traumas. As atitudes quanto à evolução constituem um bom exemplo. Na primeira década e meia após a publicação da obra de Charles Darwin, A Origem das Espécies (1859), tanto líderes religiosos quanto cientistas demonstraram grande ceticismo quanto à teoria da evolução através da seleção natural. Pensadores progressistas como Horace Bushnell se uniram a conservadores como Charles Hodge e moderados como Phillips Brooks no sentido de rejeitar essa teoria como uma afronta às sensibilidades morais e às pressuposições teistas. Por outro lado, o mais notável dos primeiros defensores de Darwin nos Estados Unidos foi Asa Gray, um botânico de Harvard que insistia que a teoria da evolução era compatível com o desígnio inteligente de Deus com relação ao universo, bem como com o cristianismo ortodoxo, trinitário.
Mais tarde, quando o mundo científico gradualmente veio a aceitar os princípios evolucionários gerais, os protestantes começaram a dividir-se. Charles Hodge considerou a evolução proposta por Darwin como “ateísmo”, porque ele não encontrou nas obras desse autor qualquer espaço para o propósito divino no controle do mundo. Do outro lado estavam pensadores que alteraram radicalmente algumas concepções cristãs tradicionais para adaptá-las ao modelo evolucionário, mas não havia muitos deles até o início do século XX. Muito mais comum do que a pura e simples rejeição ou aceitação do darwinismo foram as tentativas de fazer pequenos ajustes tanto no pensamento cristão tradicional quanto nas concepções populares acerca do cosmos, como foi o caso de alguns professores de Yale e Princeton. Esses protestantes sentiam que a fé cristã histórica e a crença tradicional no ordenamento divino do mundo podiam harmonizar-se com a crença em algum tipo de evolução.
Benjamin B. Warfield (1851-1921), professor do Seminário de Princeton e principal defensor da inerrância das Escrituras no final do século 19, escreveu em 1888 que não julgava haver qualquer afirmação geral na Bíblia ou no relato da criação que fosse oposta à evolução. Outros indivíduos que tentaram reter a antiga fé com alguma mistura de elementos modernos foram, por exemplo, os presbiterianos William G. T. Shedd (1820-1894) e Charles A. Briggs (1841-1913), e os batistas Augustus H. Strong (1836-1921) e Edgar Young Mullins (1860-1928). As diferenças que existiam entre eles eram consideráveis, mas o que tinham em comum era um protestantismo que ainda possuía as marcas do século 19. Eles estavam tão preocupados em preservar quanto ou mais que em inovar; estavam interessados em assimilar (ou pelo menos considerar plenamente) os últimos avanços da ciência e prontos a utilizar certas associações de recursos teológicos que no século seguinte tornaram-se incompatíveis, escrevendo suas teologias para orientar tanto a igreja quanto a cultura geral.
Ao mesmo tempo, os novos conhecimentos romperam o relacionamento existente entre o protestantismo evangélico e a vida intelectual da nação ao eliminarem o controle protestante da educação superior americana e abrirem a porta para interpretações seculares da vida. Mais que isso, no alvorecer do século XX, surgiram dois pólos de teologia protestante radicalmente opostos: modernismo e fundamentalismo. Os modernistas eram protestantes que sentiam ser necessário adaptar a fé cristã às normas definidoras da cultura moderna. Os representantes mais destacados dessa posição foram homens como o ministro congregacional Theodore Munger (1830-1910), o professor e presidente do Seminário Union de Nova York, Arthur Cushman McGiffert (1861-1933), e especialmente o deão da Escola de Teologia da Universidade de Chicago, Shailer Mathews (1863-1941), autor do conhecido livro A Fé do Modernismo (1924).
As respostas fundamentalistas aos novos desafios abrangeram um amplo espectro. De um lado houve intelectuais respeitados como J. Gresham Machen (1881-1937), professor de Novo Testamento no Seminário de Princeton e autor do livro Cristianismo e Liberalismo (1923); do outro lado, proponentes do dispensacionalismo pré-milenista como Cyrus I. Scofield (1843-1921), autor da edição comentada da Bíblia que leva o seu nome. Um movimento protestante ainda mais conservador no final do século 19 foi o que recebeu o nome de “holiness” (santidade), derivado do metodismo e um precursor direto do pentecostalismo do século XX.
Fonte
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Períodos: Mark Noll, A History of Christianity in the United States and Canada (1992)
I. Primórdios
1. Expansão européiae colonização católica: Nova Espanha, Nova França, Maryland
2. A Reforma inglesa e os puritanos: Inglaterra, Virgínia, Plymouth
3. Outros primórdios: batistas, anglicanos, quakers, presbiterianos, reformados e pietistas, índios e escravosII. Americanização
4. Renovação da piedade (1700-1750): Solomon Stoddard e Cotton Mather; o Grande Despertamento (George Whitefield e Jonathan Edwards); seus efeitos
5. As igrejas na revolução: patriotas e monarquistas; a fé dos fundadores; a escravidão
6. A revolução nas igrejas: separação igreja-estado; democracia populista; teologia americanaIII. O “Século Protestante”
7. Mobilização evangélica: o Segundo Grande Despertamento; metodistas e batistas; Finney; mulheres; missões
8. Os “forasteiros”: adventistas, mórmons, negros, católicos, imigrantes
9. A “América Evangélica” (1800-1865): missões, educação, teologia, política
10. [O Canadá cristão]
11. Os últimos anos da “América Protestante” (1865-1918): evangelismo e missões, reforma moral, política protestante, o Evangelho Social, o movimento ecumênicoIV. A Emergência do Pluralismo Religioso
12. A Guerra Civil
13. Grupos não-brancos e não-protestantes: negros, ortodoxos, católicos
14. O protestantismo abalado: desafios intelectuais e teológicos
15. Legados da “América Cristã”(a) Sydney Ahlstrom, A Religious History of the American People (1972)
I. Prólogo Europeu: catolicismo, Reforma, puritanismo, colonização
II. A Fundação do Império Protestante: Nova Inglaterra, Rhode Island, colônias do sul e colônias centrais (holandeses, puritanos, quakers, anglicanos, pietistas reformados e luteranos)
III. O Século de Despertamento e Revolução: presbiterianismo, o Grande Despertamento, Jonathan Edwards e teologia, catolicismo, iluminismo, revolução
IV. A Era Dourada do Evangelicalismo Democrático: unitarianismo, teologia da Nova Inglaterra, o Segundo Grande Despertamento, metodistas e batistas, presbiterianos e congregacionais, seitas e movimentos comunitários
V. Religiões Competidoras: luteranismo, catolicismo, anti-catolicismo e movimento natisvista, judaísmo, romantismo
VI. Escravidão e Expiação: reformas humanitárias, escravidão e divisão, Guerra Civil e reconstrução, igrejas negras, igrejas brancas do sul
VII. As Dores da Transição: crescimento urbano, imigração, teologia liberal, evangelho social, tensões no protestantismo e catolicismo, protestantismo militante
(b) Edwin Gaustad, A Religious History of America (1990)
I. A Era da Exploração (1492-1607): índios americanos; primeiros esforços missionários e colonizadores dos franceses, espanhóis e ingleses
II. A Era da Colonização (1607-1775): a religião das colônias inglesas
III. A Era da Expansão (1775-1898): revolução e separação igreja-estado,despertamento e inovações, evangelização do oeste, abolicionismo e Guerra Civil, diversidade religiosa e imigração, urbanização e industrialização
IV. A Era do Império (1898-1962): da Guerra Hispano-Americana até o Vaticano II; tema: o ingresso dos EUA no cenário mundial; missões domésticas e mundiais; grupos religiosos; controvérsias teológicas.
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